Conflito entre Israel e Hezbollah já matou cerca de duas mil pessoas, incluindo civis. Brasil tem defendido saída diplomática; Lula é 'persona non grata' para governo israelense. Especialistas em relações internacionais, diplomatas e economistas ouvidos pela GloboNews afirmam que Estados Unidos e Irã são países que teriam influência para frear a guerra entre Israel e o grupo extremista Hezbollah.
Eles acrescentam que o Brasil, que tem defendido a saída diplomática, ajudaria de maneira indireta, conversando com Rússia e China, por exemplo – grandes potências com interesses econômicos na região.
O conflito já levou à morte de cerca de duas mil pessoas, incluindo civis, e deixou mais de 6 mil pessoas feridas, segundo levantamento do Ministério da Saúde do Líbano.
Área destruída após bombardeio em Beirute, no Líbano
Iyad Reslan/Arquivo Pessoal
Financiadores
Segundo os especialistas, Israel, embora tenha "vontade própria", age dessa maneira por receber apoio financeiro e militar dos Estados Unidos, e o Hezbollah, por sua vez, por ser financiado pelo regime iraniano.
Para o professor Pio Penna Filho, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), embora o conflito envolva diretamente Israel e Hezbollah, Estados Unidos e Irã são os principais interessados, pois financiam as duas partes.
Ele lembra que há outros atores internacionais interessados no tema, no que ele chama de "hierarquia secundária", entre os quais França, Inglaterra e Alemanha a favor de Israel, além da Rússia – parceira do Irã.
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Penna Filho acrescenta que, embora a eleição americana – disputada por Kamala Harris (do Partido Democrata) e Donald Trump (do Partido Republicano) – tenha candidatos com propostas distintas para a política interna, a política externa dos Estados Unidos dos dois partidos não deve ser diferente independentemente do resultado uma vez que o povo americano dá apoio maciço a Israel.
"As pessoas têm a ideia equivocada que a política externa dos republicanos é muito diferente da dos democratas, não é. É uma ilusão, a política externa americana não funciona assim. Israel tem vontade própria, o que é um problema maior, os Estados Unidos não controlam completamente Israel como o Hezbollah é controlado pelo Irã, o Hezbollah não age sem autorização do Irã. Mas os Estados Unidos financiam Israel e, portanto, poderiam frear o conflito", afirma.
Um diplomata brasileiro que já atuou em Israel disse à GloboNews, na condição de anonimato, que concorda com a opinião do professor. Para ele, grandes potências econômicas e militares mundiais poderiam influenciar os rumos da guerra, uma vez que têm aliados na região e interesses econômicos.
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Esse mesmo diplomata avalia que "faz sentido" as chamadas superpotências se envolverem por não quererem uma guerra ampliada, mas a falta de capacidade da Organização das Nações Unidas (ONU) de evitar o conflito ou de conseguir pôr fim à guerra reforça a defesa brasileira pela reforma do Conselho de Segurança.
"Isso, mais uma vez, mostra aquilo que sempre falamos: que é preciso reformar esses órgãos de governança global, inclusive o próprio Conselho de Segurança, para que sejam mais representativos. Já alertávamos para a nossa preocupação com o alastramento do conflito. Essa governança está muito inoperante em temas de paz e segurança, isso é muito preocupante", afirmou.
Atuação do Brasil
Para o professor Pio Penna Filho, o Brasil não tem atualmente "nenhuma" condição de mediar um eventual cessar-fogo, mas poderia atuar de forma indireta, isto é, procurando outros países com peso político em nível global.
Entre esses países, o professor cita como exemplos Rússia e China, países que compõem junto com o Brasil os grupos do Brics e do G20, por exemplo.
"O Brasil, na minha opinião, não tem toda essa influência na política internacional, muito menos no Oriente Médio. [..] Se fosse o caso [de atuar], teria que ser com a China, a Rússia. O Brasil não tem a ilusão de pensar que teria alguma influência ali. O presidente Lula poderia conversar com o Xi Jinping, com o Putin, ainda mais que tem o Brics", afirmou.
No ano passado, o presidente Lula foi declarado "persona non grata" pelo governo de Benjamin Netanyahu por ter comparado o que acontecia em Gaza – com a morte de milhares de civis em meio ao conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas – ao que o regime nazista de Adolf Hitler fez com os judeus, o que gerou uma crise diplomática entre os dois países.
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Um integrante do Ministério das Relações Exteriores com experiência em países como Estados Unidos e Israel declarou à GloboNews avaliar que, neste momento, a prioridade do Brasil deve ser repatriar os cidadãos que querem deixar a região e participar eventualmente de discussões que priorizem a solução diplomática como saída para o conflito.
"Vamos ter que seguir falando muito com os governos locais sobre esses aspectos de retirada de brasileiros, por exemplo. Tudo isso exige negociação. E também vamos indicando o que achamos que são as medidas corretas: soluções políticas e diplomáticas para os problemas imediatos e reforma urgente do sistema internacional para lidarmos de forma mais ampla com esses desafios", avaliou.
China de olho no efeito econômico
O professor José Luís da Costa Oreiro, do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), explica que a China, embora não seja um país com reconhecida influência na região, poderia agir por importar petróleo do Oriente Médio, principalmente do Irã.
"A China importa muito petróleo iraniano, e uma guerra regional entre Israel e Irã, por exemplo, que subisse em alguns tons o conflito poderia colocar o preço do barril a níveis estratosféricos, o que não é interesse da China", afirmou.
"Quando teve a reunião do Conselho de Segurança com os embaixadores, o entendimento que tive foi que os grandes países do mundo disseram a Israel e Irã que não vão deixar os dois levarem o mundo a uma terceira guerra. Não vejo nenhum interesse das grandes potências em que o conflito escale ainda mais", acrescentou.
Em entrevista ao Jornal Nacional, o professor de Relações Internacionais Mark Storella, da Universidade de Boston (EUA), disse avaliar que a China, embora não tenha influência na região, teme que o conflito prejudique a economia.
"A China tem pouca influência no Oriente Médio. O interesse dos chineses é garantir acesso às fontes de energia da região e, nesse sentido, são grandes aliados dos Estados Unidos", explicou.