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Advogadas se encontraram três vezes com secretário em menos de um mês. Receita solicitou a empresa estatal investigação solicitada pela defesa três dias após reunião no Planalto. As advogadas do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) se reuniram com o então secretário da Receita Federal, José Tostes, no dia seguinte à reunião em que foram gravadas discutindo com o então presidente Jair Bolsonaro as investigações do senador pelo órgão federal.O áudio da reunião, produzido pelo então diretor da Abin, o hoje deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) foi divulgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira (15).Veja transcrição do STF da reunião entre Bolsonaro e Ramagem; PF diz que foi discutida proteção a Flavio contra investigaçõesSegundo a Polícia Federal (PF), a reunião ocorreu no dia 25 de agosto de 2020. Os registros de entrada do Palácio do Planalto, obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, apontam que as advogadas Luciana Pires e Juliana Bierrenbach entraram no prédio às 18h42 e deixaram o palácio às 19h56. A agenda oficial de Bolsonaro não registra o encontro.Durante a reunião, as advogadas, o ex-presidente, Ramagem e o então ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, discutiram formas de buscar em órgãos oficiais dados sobre investigação contra o senador do PL e deixar isso "fechadíssimo".Ouça a íntegra do áudio em que Bolsonaro e aliados discutem blindagem de Flavio BolsonaroDescredibilizar a ReceitaUma das linhas de investigação da Polícia Federal é de que o entorno de Bolsonaro buscava quem dentro da Receita estava fazendo a investigação, para, posteriormente, tirar a pessoa do processo.Para isso, as advogadas cogitaram acionar o GSI para levantar possíveis irregularidades contra os servidores da Receita."Eu acredito, até que se isso aqui vier à tona, a gente vai ser bastante, é atacada, mas francamente, eu não tenho o pouco nem pouco a fazer. O que é que acontece? Eu juntei aqui. Eu fiz um, um pedido, é, general. Especialmente pro GSI. Porquê? É um pedido de averiguação. Dos sistemas de inteligência que atendem à Receita Federal, mas o pedido precisa, a averiguação precisa, feita, feito pelo Serpro", afirmou a advogada Juliana Bierrenbach.Durante a discussão sobre possíveis abordagens, Bolsonaro afirma que "é o caso de conversar com o chefe da Receita". Mais tarde, já fora da sala, Ramagem diz às advogadas que "a melhor saída é dentro da Receita, pegando sério.""É uma apuração administrativa que se trovar, judicializa. Tem que ser lá de dentro", diz o então diretor-geral da Abin. "Não pode ser do agente político, ministro da Economia, tem que ser na Receita, mostrando que tem uma notícia para ele, para ele botar para baixo."Encontros intercaladosNo dia seguinte, 26 de agosto, há um novo registro de visita da advogada Luciana Pires ao Planalto. Desta vez, segundo os dados oficiais, a visita foi ao segundo andar do prédio – não há registro de quem se encontrou com a advogada. Luciana permaneceu no prédio entre 11h05 e 11h26.No mesmo dia, as duas advogadas foram recebidas na Receita Federal pelo então secretário do órgão, José Tostes. O encontro foi informado pela Receita à Câmara dos Deputados, em 2021, após pedido de parlamentares de acesso a informações sobre os encontros. Tostes receberia uma das advogadas mais uma vez no dia 4 de setembro.No mesmo mês, Tostes consta de duas agendas oficiais com Jair Bolsonaro:a primeira, em 9 de setembro, incluía também o chefe do secretário, o então ministro Paulo Guedes; eoutra em 11 de setembro, esta com Guedes, Tostes e outras pessoas.Não há registro na agenda oficial da Presidência sobre o tema dos encontros.Cerca de uma semana após a última agenda de Tostes no Planalto, o secretário da Receita se reuniria mais uma vez com a defesa de Flávio Bolsonaro e o próprio senador, desta vez. O encontro ocorreu, segundo informou à Receita à Câmara, na residência do senador. No mesmo documento, Tostes disse à Câmara que os encontros ocorreram a pedido do senador e de suas advogadas."As reuniões de 26 de agosto de 2020 e 4 de setembro de 2020 foram agendadas pelas representantes legais do Senador Flávio Nantes Bolsonaro e a de 17 de setembro de 2020, pelo próprio Senador", diz o ofício, que informa ainda que as pautas do encontro incluíam "notícias sobre suposta atuação irregular de servidores da Receita Federal no exercício de atividades funcionais."Investigação solicitada pela ReceitaOutros documentos a que o g1 teve acesso revelam que, dois dias após a primeira reunião com Tostes, em 28 de agosto, a Receita Federal pediu ao Serpro que realizasse uma análise desejada pela defesa do senador. O Serpro é a empresa pública responsável pelo processamento de dados da Receita Federal.Em documento de 16 de outubro dirigido às advogadas, o então diretor-presidente do Serpro, Gileno Gurjão, diz ter recebido da Receita "a demanda COTEC 0175/2020 para a realização de apurações especiais com objetivo de identificar os acessos aos sistemas" de uma lista de contribuintes da Receita que incluía o senador Flávio Bolsonaro.Ainda segundo o mesmo ofício, o Serpro disse que a Receita pediu que a demanda fosse devolvida para ajustes, e ela foi novamente recebida em 3 de setembro, com execução aprovada no dia 4 de setembro – mesma data em que uma das advogadas se reuniu mais uma vez com Tostes.No documento, o Serpro informava às advogadas que, atendendo a legislação, os resultados foram disponibilizados para acesso exclusivo pela Receita Federal do Brasil, que no momento é única entidade que tem acesso às informações solicitadas".