Advogados criticam denúncia da PGR contra parlamentar e usam argumento utilizado no arquivamento de processo contra André Janones para defender rejeição do caso no órgão. A defesa do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ) pediu ao Conselho de Ética que o processo disciplinar aberto contra ele seja suspenso até que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), que acusou o parlamentar de ser mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) em 2018.
Brazão é alvo de um procedimento no órgão que pede a sua cassação por suposta quebra de decoro parlamentar, após ter sido apontado pela Polícia Federal — junto do irmão, Domingos Brazão — como mandante da execução de Marielle e do motorista Anderson Gomes.
PF pede novo inquérito contra deputado Chiquinho Brazão
O processo no Conselho de Ética foi aberto em abril. No último mês, recebeu aval do colegiado para seguir para a fase de coleta de provas e depoimentos. Nesse período, a defesa de Chiquinho Brazão foi notificada a apresentar a defesa do parlamentar e a sugerir provas e testemunhas no processo.
Nesta quarta (12), a relatora do caso, deputada Jack Rocha (PT-ES), deverá apresentar o seu plano de trabalho, que elencará as testemunhas a serem ouvidas e as provas que serão colhidas na análise do processo.
Em documento enviado nesta segunda-feira (10), os advogados de Brazão criticam a denúncia contra o deputado no colegiado e as conclusões apontadas pela PGR e pela Polícia Federal no inquérito que tramita no STF.
Segundo a defesa do parlamentar, os supostos desvios de conduta apontados no processo do Conselho de Ética são "exatamente os mesmos que estão sob apuração perante o Supremo Tribunal Federal".
"De modo que a cassação do mandato do defendente, na linha do que trata a representação, depende da comprovação de que deputado Chiquinho é o mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco", dizem os advogados.
Os defensores do parlamentar argumentam, ainda, que, por essa razão, o processo no Conselho de Ética deveria ser suspenso "até que o STF analise a veracidade das acusações movidas em face do deputado Chiquinho Brazão".
"Quando então essa Casa terá a segurança necessária para avaliar legitimidade da cassação do mandato parlamentar", afirmam.
O Chiquinho Brazão está preso preventivamente desde março, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, referendada pela Câmara em abril. Ao decidirem pela prisão do parlamentar, os ministros do STF entenderam que havia um crime continuado e que condutas do deputado poderiam ser configuradas como tentativa de impedir o esclarecimento do crime.
Até o momento, o STF ainda não tem data para julgar se Chiquinho virará réu ou não. Há expectativa de que a análise ocorra em agosto.
Defesa critica denúncia
Chiquinho Brazão se tornou um dos principais da investigação do caso Marielle após uma delação premiada do policial militar reformado Ronnie Lessa, um dos executores do atentado contra a vereadora.
Lessa apontou Chiquinho e o irmão Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, como os mandantes do crime, que teria sido motivado por questões fundiárias no Rio.
Além dos Brazão, o delegado Rivaldo Barbosa, da Polícia Civil do Rio, também foi preso – sob a acusação de que teria auxiliado no planejamento do crime e atrapalhado as investigações.
Ao Conselho de Ética, a defesa de Brazão diz que Lessa "mentiu por inúmeras vezes às autoridades" e que a "sua versão dos fatos não tem sustentação em provas e foi desmentida por diversos fatos e elementos incontroversos".
Eles sustentam que "moldou" e "mudou" o que chamam de "narrativa" do caso.
Os advogados argumentam, ainda, que a denúncia oferecida pela PGR ao STF perdeu a sua capacidade de "visão periférica", sugerindo que os procuradores e a Polícia Federal deixaram de avaliar detalhes ou direcionaram foco sobre os irmãos Brazão.
"Embora seja legítimo o anseio pela responsabilização dos autores do homicídio de Marielle e Anderson, a comoção social não pode dar azo à destruição da vida de pessoas alheias ao fato e inocentes", dizem.
Os advogados rejeitam, também, a conclusão apontada pela PF e PGR sobre a motivação do crime. Segundo a investigação e a delação de Ronnie Lessa, a morte de Marielle foi arquitetada pelos irmãos Brazão como reação à atuação da vereadora contra um esquema de loteamentos de terra em áreas de milícia na Zona Oeste do Rio, reduto eleitoral de Domingos e Chiquinho.
A denúncia faz referência à atividade parlamentar de Marielle, como a atuação contrária a um projeto que buscava legalizar construções irregulares em terrenos nos bairros de Vargem Grande, Vargem Pequena e Itanhangá — todos localizados na Zona Oeste do Rio, região de interesse da milícia.
"Não há sequer um projeto de lei de Marielle Franco que discuta temas relacionados a questões fundiárias. É dizer, como poderia a vereadora representar grave obstáculo aos interesses da família Brazão se a sua pauta na política era diametralmente oposta?", afirma a defesa do deputado.
Argumento de Janones
No documento entregue nesta segunda, a defesa de Chiquinho Brazão pede o arquivamento do processo.
Para basear o pleito, os advogados utilizam o argumento defendido pelo deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) para arquivar um processo contra André Janones (Avante-MG) no Conselho de Ética.
Relator do caso Janones, Boulos defendeu que a denúncia não deveria prosseguir por tratar de "fatos ocorridos antes do início do mandato" de André Janones. Na argumentação, utilizou um caso antigo do Conselho de Ética que envolvia o então deputado e hoje ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa (PT-BA).
À época, o órgão rejeitou a denúncia e arquivou a ação por entender que tratava de fatos anteriores ao mandato de Costa. O deputado era acusado de participar de esquema de desvio de recursos públicos destinado à construção de 1.120 casas populares.
No caso de Brazão, o crime teria acontecido antes do início de seu primeiro mandato, em 2019.
"Seja por dever de isonomia, seja por observância aos precedentes deste Conselho de Ética, é necessário reconhecer que a representação carece de justa causa porque os fatos imputados ocorreram antes de o defendente assumir o mandato de deputado, não havendo como se falar em decoro parlamentar se não havia mandato à época", diz a defesa.
Testemunhas
A defesa de Brazão diz, no documento, que encaminhará ao Conselho de Ética um HD externo com documentos e arquivos referentes ao caso.
Eles também pede que, ao preparar seu plano de trabalho, a relatora considere uma lista de testemunhas propostas pelos advogados:
prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD)
vereador do Rio Jorge Felippe (PP)
vereador do Rio Willian Coelho (DC)
Ronald Paulo de Alves Pereira, o Major Ronald, que está preso e é apontado como um dos responsáveis por monitorar a rotina de Marielle
ex-PM Élcio de Queiroz, acusado de ser um dos executores de Marielle
deputado federal Reimont (PT-RJ)
Marcos Rodrigues Martins, assessor da Câmara de Vereadores do Rio
e o vice-presidente do Tribunal de Contas da cidade do Rio de Janeiro, Thiago Kwiatkowski Ribeiro