Parecer foi apresentado em um processo aberto pelo povo Xokleng, de Santa Catarina, sobre limites de terras. Grupo quer anular pontos da legislação. Indígena, em imagem de arquivo
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A Procuradoria-Geral da República defendeu, no Supremo Tribunal Federal, que sejam suspensos trechos da lei que estabelece um marco temporal para a demarcação de terras indígenas – aprovada no ano passado pelo Congresso Nacional.
O parecer é assinado pelo procurador-geral Paulo Gustavo Gonet Branco e foi enviado nesta quinta-feira (11) à Corte.
No documento, Gonet Branco aponta que a regra trata de pontos como a ocupação, o domínio, a posse e a exploração de terras indígenas e de suas riquezas - temas que deveriam estar em lei complementar, como prevê a Constituição.
Para o PGR, devem ser anulados, entre outros, trechos da lei que:
fixam o chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas;
permitem a instalação de bases e postos militares, redes de comunicação em terras indígenas;
impedem a cobrança pelo trânsito e a permanência de não indígenas nas áreas;
permitem a celebração de contratos de cooperação entre indígenas e não-indígenas para atividades econômicas nas áreas;
consideram de boa-fé as benfeitorias realizadas por quem ocupou a terra dos indígenas antes da demarcação;
viabilizam que antropólogos e técnicos que trabalham da demarcação sejam considerados suspeitos ou impedidos de atuar;
impedem a ampliação de áreas indígenas já demarcadas;
autorizam a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal em áreas indígenas, independentemente de consulta às comunidades.
Congresso derruba vetos de Lula à prorrogação da desoneração e ao marco temporal
Pedido
A PGR se manifestou atendendo a uma determinação do ministro Edson Fachin, relator do caso.
O ministro recebeu um pedido para suspender a aplicação da lei feito pelo Povo Indígena Xokleng, de Santa Catarina, no âmbito de uma ação que trata da disputa sobre os limites da Terra Indígena Ibirama La-Klãnõ. O grupo quer a anulação de pontos da regra.
A solicitação foi feita no âmbito de uma ação que envolve especificamente a disputa pela Terra Indígena Ibirama La-Klãnõ.
A discussão envolve a aplicação do texto no caso concreto, no conflito sobre os limites da TI, que fica em Santa Catarina. O questionamento é sobre a portaria do Ministério da Justiça, de 2003, que redefiniu e ampliou os limites da reserva.
A proposta foi feita em fevereiro deste ano. O grupo sustenta que a decisão sobre a validade da lei terá impacto no andamento de seu processo.
Por isso, pede a anulação da regra, tanto para seu caso, quanto para qualquer outro. Além disso, que a determinação do tribunal tenha efeito vinculante, ou seja, que tenha incidência obrigatória para todas as situações semelhantes.
A Advocacia-Geral da União também foi acionada para se manifestar e, em março, também defendeu a invalidação de pontos da norma.
Histórico
O marco temporal é a tese que estabelece que os povos indígenas somente terão direito à demarcação das terras já tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.
Em setembro de 2023, o Supremo considerou o critério inconstitucional e estabeleceu uma espécie de guia para a aplicação de sua decisão em processos judiciais que tratam de disputas envolvendo estas áreas.
Em uma reação à decisão do Supremo, o Congresso aprovou a lei que estabelece o marco temporal como um requisito para a definição das áreas.
A norma foi inicialmente barrada pelo presidente Lula. Mas, em dezembro do ano passado, o Legislativo derrubou os vetos, permitindo que as regras entrassem em vigor.
Na sequência, ainda em dezembro, foram apresentadas ao Supremo ações contra e a favor da aplicação da lei. Estes processos ainda não foram julgados.
Julgamento virtual
No plenário virtual, os ministros começaram a analisar, nesta sexta-feira (12), a decisão do ministro Edson Fachin de 2020, que suspendeu os efeitos de um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) com regras sobre o conceito e a demarcação de terras indígenas.
O documento foi editado em julho de 2017, no governo Michel Temer, e determina que indígenas têm direito à terra, "desde que a área pretendida estivesse ocupada pelos indígenas na data da promulgação da Constituição Federal", em outubro de 1988. Na prática, ele sintetiza a tese do "marco temporal".