Justiça Militar analisa seis pedidos de prisão preventiva de investigados como suspeitos diretos no desvio.
Para oficiais, expulsão depende de julgamento no Superior Tribunal Militar (STM) mesmo após condenação. Exclusivo: militares desligaram intencionalmente rede elétrica do quartel do Exército de onde 21 metralhadoras foram roubadas
Os militares que respondem criminalmente pelo furto de 21 metralhadoras do Arsenal de Guerra do Exército, em Barueri, na Grande São Paulo, podem receber pena de até 53 anos de prisão se forem condenados pela pena máxima de todos os crimes, considerando os agravantes de todas as punições, segundo apurou o blog apurou fontes do Superior Tribunal Militar (STM).
A dosimetria da pena e se haverá o acúmulo por causa das qualificadoras, no entanto, serão definidos após julgamento de cada caso e definição do grau da participação individual no desvio das armas.
O Exército já pediu à Justiça Militar a prisão preventiva dos investigados como suspeitos de participarem diretamente do desvio das armas. Até a última atualização desta reportagem, não havia decisão a respeito da solicitação. Caso as prisões sejam decretadas, eles serão levados para o 2° Batalhão de Polícia do Exército (BPE), em Osasco, onde ficarão em celas.
Crimes previstos
Os militares que atuaram diretamente no desvio poderão responder por furto, peculato, receptação e/ou desaparecimento, consunção ou extravio, segundo o Exército. Alguns dos crimes possuem qualificadoras, o que aumenta a pena. É o caso do furto. Segundo o Código Penal Militar, o furto simples pode resultar na prisão de um a seis anos. Mas se for praticado a noite, a pena muda de dois a oito anos. Outra qualificadora prevista ocorre no caso de furto de bem pertencente à Fazenda Nacional, que aumenta a recusão para até seis anos.
Se o furto for praticado com destruição ou rompimento de lacre, por exemplo, com abuso de confiança ou mediante fraude, com emprego de chave falsa e/ou com a participação de duas ou mais pessoas, a pena varia de três a dez anos de prisão.
No caso do peculato (que é apropriar-se de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse ou detenção, em razão do cargo ou comissão, ou desviá-lo em proveito próprio ou alheio), a prisão varia de três a 15 anos de prisão. Mas a dosimetria pode aumentar em um terço se o objeto desviado tiver valor superior a 20 vezes o salário mínimo.
Se o funcionário ou o militar contribui culposamente para que outra pessoa subtraia ou desvie o dinheiro, valor ou bem, ou dele se aproprie, a detenção definida pode variar de três meses a um ano.
Já para o crime de receptação, a pena prevista é de um a cinco anos. No caso do desaparecimento, consunção ou extravio (fazer desaparecer, consumir ou extraviar combustível, armamento, munição, peças de equipamento de navio ou de aeronave, ou de engenho de guerra motomecanizado), a condenação pode várias de um a três anos.
Expulsão depende da pena e patente
Mesmo condenados, nem todos os militares são expulsos automaticamente do Exército. Todos os processos precisam ter tramitado até o trânsito em julgado, ou seja, sem mais possibilidade de recursos.
No caso dos militares com patente de soldado até sub-tenente, para que ocorra a expulsão é necessária a condenação com pena superior a dois anos. Para oficiais, de tenente a general, a pena mínima é a mesma, mas a expulsão deverá ser analisada pelo Conselho de Justificação e passar por julgamento do Superior Tribunal Militar (STM), após ação de Incompatibilidade para com o Oficialato, impetrada pelo Ministério Público Militar.
Participações e dinâmica
O sétimo militar que também era investigado por envolvimento direto no crime não teve nenhuma prisão solicitada. E até esta quinta-feira (26) ainda não teriam indícios de que participou do desaparecimento das armas.
Entre os militares suspeitos de participarem do furto tem um cabo que é investigado por suspeita de transportar todas as metralhadoras furtadas do Arsenal de Guerra em Barueri. O Exército investiga se ele usou um carro oficial do então diretor do quartel, o tenente-coronel Rivelino Barata de Sousa Batista, para retirar as armas do local e levá-las para fora, onde seriam negociadas com facções criminosas.
Batista não é investigado no Inquérito Policial Militar (IPM) conduzido por um oficial do Comando Militar do Sudeste (CMSE). O tenente-coronel continua na ativa, mas será transferido para outra unidade militar ainda não divulgada. Ele não foi localizado para comentar o assunto até a última atualização desta reportagem.
No grupo dos sete militares investigados tem as patentes de soldado, cabo, sargento e tenente. O CMSE quer usar as informações das quebras dos sigilos bancários, telefônicos e das redes sociais autorizadas pela Justiça para levantar mais provas do envolvimento deles no sumiço das metralhadoras.
E também tentar descobrir quais tinham contatos com o crime organizado para negociar a venda. As armas iriam para o Comando Vermelho (CV), no Rio, e o Primeiro Comando da Capital (PCC), em São Paulo.
A suspeita é de que o crime ocorreu a partir do período do feriado de 7 de setembro, quando a energia elétrica foi cortada intencionalmente, causando um "apagão" que desligou as câmeras de segurança da base militar.
A energia foi religada automaticamente depois do furto. Um dos cadeados que trancava a porta foi rompido e trocado por outro. O lacre da inspeção, que fica junto com o cadeado, também teria sido adulterado para tentar enganar a fiscalização. O g1 e a TV Globo apuraram que peritos do Exército encontraram impressões digitais de militares do quartel em quadros de energia e na sala de armas.
Apesar de ter suas as impressões digitais encontradas na sala de armas, o cabo não tinha autorização para entrar no lugar. Sua "missão" se restringia a atuar como motorista do tenente-coronel Batista, que havia assumido a direção do quartel em março de 2023. O motorista militar já estava trabalhando nessa função desde a época do diretor anterior. Os investigadores suspeitam que ele tenha se aproveitado do livre acesso que tinha ao quartel, como homem de confiança do então diretor da unidade.
A última inspeção na sala de armas havia sido em 6 de setembro. Os militares só conferiram se a porta permanecia lacrada 33 dias depois, em 10 de outubro, quando um subtenente viu sinais de arrombamento e percebeu que o lacre tinha sido trocado e constatou o desaparecimento de 13 metralhadoras antiaéreas calibre .50 e de oito metralhadoras calibre 7,62.
Segundo o Exército, as armas, fabricadas entre 1960 e 1990, são "inservíveis", ou seja, não estariam funcionando perfeitamente, passariam por manutenção e seriam avaliadas. Possivelmente seriam destruídas ou inutilizadas, já que recuperá-las teria um alto custo.
Até a última atualização desta reportagem, 17 das metralhadoras foram recuperadas na semana passada em operações conjuntas do Exército e das polícias do Rio de Janeiro e de São Paulo. Outras quatro armas, todas .50, ainda são procuradas.