Aliados do governo no Congresso também criticam sequência de erros de Lula em comentários sobre temas internacionais – e temem reflexo na avaliação do governo. Diplomatas brasileiros reagiram com incômodo à fala do presidente Lula (PT) sobre as eleições na Venezuela, nesta quarta-feira (7). Questionado, Lula comparou as restrições à oposição no país vizinho à situação que viveu em 2018, quando estava preso e não se candidatou.
Em reservado, alguns representantes do Itamaraty consideraram a fala de Lula "política demais". E disseram que a diplomacia, enquanto isso, vai seguir uma linha diferente da área política.
O presidente da República foi questionado sobre as eleições na Venezuela, que tiveram sua votação marcada pela Justiça Eleitoral do país para julho. O presidente Nicolás Maduro vai concorrer à reeleição.
Uma coalizão de partidos de oposição escolheu como candidata a deputada María Corina Machado – que, em janeiro, foi declarada inelegível pela Suprema Corte controlada por Maduro. Sem mencionar o nome de candidatos, Lula comparou a situação com a vivida por ele em 2018.
"Eu fui impedido de concorrer nas eleições de 2018. Ao invés de ficar chorando, eu indiquei um outro candidato e disputou as eleições. Na Venezuela, está marcada as eleições para o dia 28 de julho, é o que eu fiquei sabendo ontem e hoje pela manhã. Agora, a pergunta de vocês é se as eleições vão ser honestas ou não. O que eu posso esperar? Que haja as eleições para a gente saber se foram democráticas ou não", disse o presidente.
Lula comenta eleições marcadas na Venezuela: 'Vão convidar olheiros do mundo inteiro'
Representantes diplomáticos brasileiros afirmaram à GloboNews que Lula abre margem para comparações entre a lisura dos processos eleitorais brasileiro e venezuelano.
Horas depois da declaração de Lula, María Corina rebateu o brasileiro em uma rede social.
"Eu chorando, presidente Lula? Você está dizendo isso porque sou mulher? Você não me conhece. Estou lutando para fazer valer o direito de milhões de venezuelanos que votaram em mim nas primárias e dos milhões que têm o direito de fazê-lo em eleições presidenciais livres nas quais derrotarei Maduro. Você está validando os abusos de um autocrata que viola a Constituição", disse.
Na noite desta quarta-feira (6), a Secretaria de Comunicação do Palácio do Planalto afirmou que, na entrevista, o presidente Lula não se referiu a ninguém especificamente – e que apenas disse que ele, Lula, não chorou, relatando a situação que viveu.
O governo disse ainda que María Corina faz "ilação sem base", já que Lula apoiou a eleição de Dilma Rousseff, primeira presidente mulher do Brasil.
Líder opositora da Venezuela rebate declaração de Lula
Pesquisa repercutiu mal no Congresso
No Congresso, aliados de Lula avaliam que o presidente pode estar revivendo o mesmo problema de Bolsonaro – "morrendo pela boca", como diz a expressão popular.
Segundo eles, Lula tem cometido repetidos erros em comentários sobre relações internacionais.
Antes, essas declarações não tinham efeito na imagem de um presidente. Hoje, com a oposição usando as redes sociais para reverberar tropeços de Lula, a situação é outra.
A pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira (6) mostrou isso, com a queda na aprovação tendo como um dos principais fatores as declarações associando as ações de Israel na Faixa de Gaza ao Holocausto nazista.
Agora, interlocutores de Lula se irritaram com a frase sobre a Venezuela.
"Não é possível que Lula não saiba que, na Venezuela, o problema não é a oposição, mas o Maduro", disse um líder aliado de Lula no Senado.
Lula e Maduro conversam sobre eleições na Venezuela
Observadores se preparam para acompanhar eleições
Com a data definida, chegou a hora de grupos de observadores começarem a se preparar para o pleito na Venezuela.
Um dos representantes de países que vão acompanhar o processo disse que há preocupação sobre se o Acordo de Barbados, assinado no fim do ano passado para garantir eleições limpas e democráticas, será cumprido.
O quarto ponto das chamadas 'Garantias Eleitorais' do Acordo prevê o convite para missões técnicas de observação eleitoral acordadas, incluindo:
União Europeia
Painel de Peritos Eleitorais da ONU
União Africana
União Interamericana de Organizações Eleitorais
Centro Carter
Os grupos de observadores, ainda segundo o acordo, terão "efeito de observação do processo eleitoral presidencial, com estrita observância da Constituição, da lei e dos acordos celebrados com o Poder Eleitoral, sem prejuízo do direito dos atores políticos de convidarem acompanhantes nacionais e internacionais, nos termos da lei".
Alguns desses observadores participaram da missão de observação das eleições do Brasil, em 2022. É o caso do Carter Center, uma organização não governamental sem fins lucrativos, fundada em 1982 pelo ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter.