Ministros analisaram ação de partidos que contestava lei de 2021 sobre a distribuição das sobras em eleições proporcionais. Se a decisão fosse aplicada às eleições de 2022, sete deputados perderiam a vaga, o que não ocorreu. A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou, nesta quinta-feira (28), para invalidar as regras aprovadas pelo Congresso Nacional de distribuição das chamadas sobras eleitorais, vagas não preenchidas na eleição para deputados e senadores.
Também foi formada maioria para aplicação do entendimento para eleições futuras. Com isso, a decisão não vai afetar a atual configuração da Câmara dos Deputados.
Se os ministros tivessem entendido que a decisão firmada nesta quarta valeria também para as eleições de 2022, sete deputados federais eleitos naquele ano perderiam a vaga e dariam lugar a outros candidatos (veja mais abaixo).
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O que são as sobras eleitorais?
O termo sobras eleitorais se refere ao seguinte:
?? Nas disputas para o Legislativo (deputados e vereadores), a eleição é proporcional. É diferente da eleição para presidente ou governador, por exemplo, que é majoritária.
Na eleição majoritária, o candidato com mais votos ganha.
Na proporcional, o eleitor pode escolher se vota no partido ou no candidato. Mesmo o voto no candidato é computado também para o partido.
A proporcional tem outra característica própria: ela utiliza um número calculado pela Justiça, chamado quociente eleitoral, que leva em conta a quantidade de eleitores e de vagas em disputa.
O quociente eleitoral estabelece o número mínimo de votos que um partido precisa para eleger um candidato. Se o partido atinge a quantidade determinada pelo quociente eleitoral uma vez, tem direito a eleger seu candidato mais bem votado. Se atinge duas vezes, elege seus dois mais votados. E assim sucessivamente.
O problema é que a quantidade de votos recebida por todos os partidos é um múltiplo não exato do quociente eleitoral, um número não redondo.
A parcela que resta são as chamadas sobras eleitorais.
?? Exemplo prático:
Se o quociente eleitoral for 100 mil e as vagas em disputa forem 3:
O partido A obteve 100 mil votos: elegeu 1 deputado. O partido B obteve outros 100 mil e, portanto, obteve o direito de também eleger o seu candidato mais bem votado.
Os partidos C, D e E não chegaram a 100 mil votos. E o total de votos nas eleições, dados por todos os eleitores foi de 322 mil. Logo, a sobra é de 122 mil (300 mil menos os 200 mil obtidos por A e B). O que fazer com a sobra?
A solução do STF
Uma lei aprovada em 2021 no Congresso criou regras para distribuir as sobras eleitorais. Só teriam direito a elas:
os partidos que tenham obtido pelo menos 80% do quociente eleitoral; e
os candidatos que tenham obtido votos em número igual ou superior a 20% desse quociente.
Antes da lei, todos os partidos e candidatos tinham direito a participar das sobras. Ou seja, candidatos de partidos abaixo do quociente, mas que obtiveram mais votos que os demais, podiam se beneficiar das sobras.
A restrição do acesso às sobras, estabelecida pela lei de 2021, foi questionada no STF pelos partidos Rede Sustentabilidade, PSB, Podemos e PP.
O argumento é que a lei é inconstitucional porque dificulta a participação dos partidos na divisão das sobras e também porque essa mudança deveria ter sido feita por meio de uma emenda à Constituição, que exige mais votos, e não por um projeto de lei.
No julgamento de hoje, a maioria do STF concordou com a argumentação dos partidos e votou para derrubar a lei de 2021. Com isso, voltam as regras de antes.
Quais deputados poderiam perder o mandato?
Quais deputados podem perder o mandato?
Segundo a Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), se prevalecer a aplicação em 2022 do entendimento proposto por Lewandowski, os seguintes deputados perderiam os mandatos:
Silvia Waiãpi (PL-AP)
Sonize Barbosa (PL-AP)
Goreth (PDT-AP)
Augusto Pupiu (MDB - AP)
Lázaro Botelho (PP- TO)
Gilvan Máximo (Republicanos-DF)
Lebrão (União Brasil-RO)
Eles seriam substituídos, respectivamente, por:
Aline Gurgel (Republicanos-AP)
Paulo Lemos (PSOL-AP)
André Abdon (PP-AP)
Professora Marcivania (PCdoB-AP)
Tiago Dimas (Podemos-TO)
Rodrigo Rollemberg (PSB-DF)
Rafael Fera (Podemos-RO)
Após a decisão do STF ratificar que não haveria perda de vaga, o deputado Gilvan Máximo (Republicanos-DF), que corria risco, foi visto comemorando na Praça dos Três Poderes ao lado da esposa e da filha.
Histórico
O caso começou a ser analisado pela Corte em abril do ano passado, mas um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes suspendeu a análise. O tema voltou à pauta ainda em agosto de 2023, mas novo pedido de vista, desta vez do ministro André Mendonça, adiou novamente o desfecho do processo
O relator, ministro Ricardo Lewandowski (hoje aposentado), votou para ampliar a participação de partidos e candidatos na distribuição das "sobras". Na sequência, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes concordaram com a ampliação dos partidos na divisão das vagas. No entanto, os dois ministros sustentam que as mudanças já devem valer para os resultados de 2022, o que afetaria a correlação de forças na Câmara.